Voz de Poder: rap, cultura urbana e realidade

Por Caio Machado

Luizão, Cássio, Eduardo e Resgate

23 anos atrás surgia o “Voz de Poder”, um dos grupos de rap mais importantes da cidade de Patos de Minas. Com quatro álbuns lançados, um EP e dezenas de singles, o conjunto que retrata o cotidiano da periferia por meio das letras e batidas é formado por Eduardo, Luizão, Mano Resgate e DJ CD.

A história do grupo de Voz de Poder tem início em 1997, quando os amigos Cássio Denner e Valdinei rimavam juntos utilizando como alcunha a sigla CD e DNI, iniciais dos respectivos nomes dos artistas. Cássio e Dinei costumavam se apresentar em festivais de dança e eventos da Prefeitura.

Em 1997, eles se inscreveram para um festival de música gospel que iria acontecer na Praça do Cruzeiro, no Bairro Nossa Senhora das Graças. Eles ensaiaram a canção “Oh, Deus”, do grupo de rap Vítima Fatal e contariam com a participação de um trio feminino cantando o refrão.

Na ocasião, Dinei não pôde participar, porém Cássio Denner cantou a música acompanhado do coral e eles conquistaram o segundo lugar da competição. Eles ganharam um CD de música gospel e a faixa “Voz de Poder”, do Grupo Órion, presente na coletânea serviu para dar nome ao grupo que surgia durante aquele festival.

Dinei e Cássio Denner

A primeira música do conjunto foi gravada no mesmo ano. “Acredito que a música ‘Pra que lado eu vou seguir’ deve ter sido um dos primeiros raps a serem gravados em Patos de Minas. Fizemos ela no Estúdio H2A do Beto Amorim e ela tocava bastante no programa do Willer Lopes da 99 FM e em algumas rádios piratas da cidade”, lembrou Cássio.

Cássio Denner e Dinei chegaram a apresentar um programa de rap na extinta Aquarela FM. "Quero ouvir um rap" ia ao ar nas noites de domingo e provavelmente foi o primeiro programa deste segmento a estrear nas ondas do rádio em Patos de Minas.

Por retratar a realidade das ruas e periferia, o Grupo Voz de Poder sempre teve uma ligação muito forte com segmentos urbanos artísticos e esportivos como o skate e grafite, criando assim uma base de fãs que acompanha e cantava junto durante apresentações pelas praças da cidade.

Nos dois anos seguintes, o Voz de Poder compôs dez faixas e o membro Guine se juntou ao grupo. Em 1999, as composições estariam presentes em “Pra que lado eu vou seguir”, primeiro álbum lançado de forma totalmente independente pelo conjunto de rap, que começava a ganhar notoriedade na região.

Com o lançamento do álbum, as músicas do Voz de Poder começaram a se espalhar por Minas Gerais afora, por meio de coletâneas piratas de rap e por esforço do próprio grupo, que tentava a sorte enviando o CD por carta para selos de música em diversas regiões do país.

Cássio Denner lembra que a primeira grande apresentação do grupo ocorreu por meio de um convite feito por Adailton Fonseca da loja de CDs “A Musical”, para que o Voz de Poder abrisse o show do consagrado rapper brasiliense DJ Jamaika que iria acontecer na cidade.

O grupo abrindo o show do DJ Jamaika em 1999

Entre os 2000 e 2008, o grupo cresceu com a chegada dos membros Bette P., Carol, DJ Yellow e Resgate. Eles figuraram nas coletâneas Invasão Periférica I e Invasão Periférica II e realizaram shows em cidades como Araxá, João Pinheiro, Uberlândia, Paracatu, BH, dentre outras.

Segundo Cássio, um dos shows mais marcantes do grupo Voz de Poder ocorreu durante a Feira da Lua, evento realizado em Sobradinho/DF, quando eles tiveram a oportunidade de se apresentar ao lado do grupo Guind’Art 121 e outros nomes de peso do cenário rap nacional.

Em 2004, eles também abriram um show do famigerado Racionais MC’s, na Acrópole de Uberlândia, para uma plateia de mais de cinco mil pessoas. Um inusitado acontecimento, porém, quase impossibilitou que o grupo conseguisse se apresentar naquela noite.

“Sempre que começávamos a tocar, caía a energia. Íamos cantar a música ‘Cilada’, que começa com os versos ‘Vai morrer, vai morrer’ e pelo fato de ter ocorrido dois blecautes, a plateia decorou a introdução e quando começamos de vez, eles cantaram junto e deram o gás necessário para que fizemos um bom show”, contou CD.

Voz de Poder em 2001

DNI deixou o grupo em 2006, e em 2008, eles lançaram o álbum “Quem julga, será julgado”, com a produção musical assinada por Duckjay da Tribo da Periferia. Eles também lançaram o DVD duplo "Sonhadores", gravado pelo grupo no Teatro Municipal, com a participação do Rei do grupo brasiliense Cirurgia Moral.

Nos anos seguintes, as cantoras Bette P. e Carol deixariam o grupo e Luizão ingressaria. Em 2012, o grupo lançou “Aonde está a paz?”, também produzido por Duckjay. O disco conta com os maiores sucessos comerciais do Voz de Poder: Cilada II, Sua Falta e Do Barraco pra Cá, que conta com milhares de execuções no YouTube e Spotify.


Quatro anos depois, em 2016, o álbum “Posso Ser”, mais uma vez produzido por Duckjay é lançado. Guine e DJ Yellow deixam o Voz de Poder e Eduardo entra, consolidando a formação atual do grupo. Nos anos que se passaram, o grupo participou de mais coletâneas e mixtapes de rap por todo o país.

Desde 2009, o Voz de Poder realiza as próprias gravações no home studio “Canil da Norte”. Inicialmente eles gravavam as linhas vocais e enviavam para produtores de fora. Hoje, eles ainda contam com beats feitos por artistas de todo o país, mas eles mesmo mixam e masterizam as próprias faixas.

A formação atual durante show em Presidente Olegário

“A partir de 2016, o home studio virou uma empresa e trabalhamos produzindo vários artistas de Patos de Minas e região. Funciona praticamente como uma gravadora revelando talentos e além disso, também é o laboratório do Voz de Poder, para elaboração de nossas próprias músicas”, explicou Cássio.

Cássio relata que o amor que o grupo sente pelo rap quebra qualquer barreira ou preconceito. “Não vamos desistir, mesmo estando numa cidade preconceituosa. Já recebemos muitas portas na cara, mas outras também se abriram. A burguesia tem medo do rap, mas é eles que estão perdendo”, disse CD.

“Mudamos a vida de muitas pessoas com nossas letras e com frequência recebemos mensagens de pessoas questionando como é que não fizemos mais sucesso. Para nós, mudar a vida das pessoas para melhor é o máximo de sucesso que podemos obter, não há nada que pague este tipo de agradecimento”, finalizou.

Desde 2019, o grupo deu início à série de EPs intitulada “Mundo Mágico do Voz” que serão lançados com diversos subtítulos. Cássio afirma que o conjunto está a todo vapor nas produções e promete novidades. Acompanhe o trabalho do Grupo Voz de Poder pelo Instagram e Facebook.


Apoie o jornalismo independente e colabore com doações mensais de a partir de R$1,99 no nosso financiamento coletivo do Padrim: https://padrim.com.br/jornaldepatos

Postar um comentário

0 Comentários