Sobre a primeira dama, a misoginia de Bolsonaro e a força da mulher patense

Por Caio Machado


O mesmo Jair Messias Bolsonaro que em 2011, disse para a cantora Preta Gil, no extinto programa televisivo CQC, que os filhos dele não se envolveriam com uma mulher negra, por terem sido muito bem educados e não frequentarem ambientes promíscuos, aparece em um post da primeira dama de Patos de Minas, Ludimila Falcão, parabenizando mulheres patenses pelo dia internacional das mesmas.

O mesmo ex-paraquedista e capitão reformado, que afirma que licença maternidade prejudica o patrão e que as mulheres deveriam ganhar menos; que disse em 2014 à deputada federal Maria do Rosário (PT) que ela não era digna ser estuprada por ser feia... Sim, esse mesmo Bolsonaro, aparece ao lado da esposa de Luís Eduardo Falcão para enaltecer a data escolhida para homenagear as mulheres...

Daria ainda pra citar a famosa “fraquejada” ou relembrar quando Bolsonaro disse que a jornalista Patrícia Campos Mello queria dar o “furo”, uma imatura forma de comparar o furo jornalístico (para leigos, é o jargão para uma revelação jornalística) com a prática de sexo anal, inclusive, diminuir mulheres e falar da sexualidade alheia, figura como uma das maiores preocupações e pautas do atual presidente.

Todo mundo sabe que o Bolsonaro é misógino, adjetivo que até maio de 2019, o presidente revelou numa entrevista ao periódico argentino La Nación, que sequer sabia o significado. E pra simplificar ao leitor que chegou até aqui e desconhece do que se trata: a palavra misoginia vem do grego, com “miseo” traduzido como “odiar” e “gyne” significando “mulher”. Um tanto quanto autoexplicativo.

A primeira dama de Patos de Minas provavelmente sabe de tudo isso sobre o presidente e mesmo assim, aproveitando que estava num evento político em Brasília, pediu para ele parabenizar as mulheres patenses. Engana-se quem pensa que tudo isso não foi meticulosamente pensado ou que é a primeira vez que ela, o marido ou alguém da gestão atual tenha demonstrado alinhamento ao gestor da nação.

Quando candidato, Falcão deixava claro que estava com Bolsonaro e Zema, tanto que isso estava impresso no texto do santinho que circulou durante a campanha de 2020. Além disso, ele respondia nas redes sociais quando as pessoas o questionavam se ele gostava do presidente. Atribua isso fato que mais de 70% do eleitorado patense votou no Bolsonaro e temos um outsider eleito, com uma pequena ajudinha disto.

Até aí nada de errado, todo candidato apoia quem quiser e coliga com quem for de interesse. Mas não para por aí... Talvez muitos tenham se esquecido de quando a vice-prefeita Sandra Gomes publicou uma foto sem máscara ao lado de Bolsonaro. Era 23 de fevereiro de 2021, e a pandemia da Covid-19 estava em um dos momentos mais críticos. O mau exemplo da vice com o presidente pegou mal, tanto que a imagem foi até deletada ou arquivada do Instagram de Sandra.


Ludimila não chegou a apagar o vídeo que postou no Dia Internacional das Mulheres ao lado do presidente, mas o número de reações negativas ao mesmo, abriu uma mácula na imagem da primeira dama, que pela manhã desta quarta-feira (09), divulgou um vídeo em que aparece dentro de um automóvel justificando a escolha infeliz da figura de Bolsonaro para a “homenagem” as mulheres.

Nas palavras de Ludimila Falcão, o compromisso com Patos de Minas e a crença na força da mulher patense teriam motivado o pedido para que Jair Bolsonaro gravasse o famigerado vídeo, que já soma mais de 12,2 mil visualizações. Além disso, ela enalteceu que o post não se tratou de um ato partidário e que faria o mesmo pedido a qualquer que fosse o presidente em exercício.

Ela só se esqueceu de dizer que independente de partidarismo - mesmo todos nós sabendo das predileções bolsonaristas dela e do esposo - que a figura de Jair Bolsonaro em si, vai diretamente na contramão de qualquer luta feminina. Pelos motivos ditos no início do texto e por tudo que já estamos cansados de saber que o Bolsonaro representa, ou não representa.

Rola por aí o boato de que Ludimila irá se lançar como deputada e que a campanha dela teve início com o “Renascer Natalino” e até mesmo com o Programa “Absorvendo Afetos”, que ironicamente combate a pobreza menstrual no município e foi criado pelo fato do próprio Bolsonaro ter vetado trechos de um projeto de lei que iria distribuir absorventes gratuitamente para mulheres em situação de vulnerabilidade...

Isto foi em outubro de 2021, e para jogar a sujeira debaixo do tapete, visto que além de Patos de Minas, inúmeros municípios país afora criaram campanhas de combate a pobreza menstrual, Bolsonaro assinou ontem um decreto que destinará 130 milhões de reais para a distribuição de absorventes a mulheres vulneráveis. Parece o mesmo cenário do gás de cozinha: primeiro aumenta-se o preço, depois oferece-se vale-gás.

E voltando ao post da primeira dama. Ela faz o que ela quiser, posta vídeo nas redes sociais com quem preferir - isto soando eticamente incorreto ou não - e se candidata ao que quiser, a vida é dela. Mas não sei se dá pra comprar a ideia de que aqueles decepcionantes oito segundos em que ela aparece ao lado do presidente (misógino como tal) foram apenas para enaltecer a força da mulher patense...

Saliento que este artigo de opinião não foi redigido para depreciar a imagem da primeira dama ou de qualquer outra mulher. Acho que fui claro em enfatizar que a figura do presidente em si motivou tal nota de repúdio. Ademais, adoraria que houvesse uma maior participação feminina na política de Patos de Minas. Infelizmente temos só uma vereadora na Câmara Municipal e a vice-prefeita. Anseio sinceramente para que a força da mulher patense referida por Ludimila ganhe o espaço que merece.


Caio Machado é bacharel em Jornalismo pela Universidade do Estado de Minas Gerais. Além de editor-chefe do Jornal de Patos, também atua como repórter televisivo, produtor musical e artista independente.

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4 Comentários

  1. Péssima escolha para esse dia tão especial. Temos muitos bons exemplos por ai.

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  2. Realmente, cada um ou uma faz o que quer com as suas preferências políticas e as suas candidaturas. Mas esse presidente chauvinista prestar homenagem às mulheres patenses ou a outras, só pode ser zoeira, como os fakes news, que ele e sua turma de misóginos e lgbtfóbicos divulgam diuturnamente.

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  3. Os governantes e os seus chegados, sobretudo os eleitores, deveriam ler, não só, "O Príncipe", de Nicolau Maquiavel [1513], mas também, "Discurso da servidão voluntária" [c. 1540], de Étienne de La Boétie. O primeiro nos mostra como seria governar pelo bem ou pelo mal, e o segundo tenta nos mostrar, como ser servil ao mais cruel e cretino dos governantes machos ou fêmeas, sem se revoltar. E existe um outro opúsculo, não mais do século XVI, mas do XVIII, "Resposta à pergunta: que é esclarecimento?" : [1783]. de Emanuel Kant. Ele, que provavelmente leu os outros dois, tenta explicar, porque alguns homúnculos, em pleno iluminismo se deixam ser usados, pisados e humilhados: "A preguiça e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande parte dos homens [e mulheres], depois que a natureza de há muito os libertou de uma direção estranha, continuem no entanto de bom grado menores durante toda a vida." De fato, ainda hoje, pessoas ilustradas ou submersas em suas próprias sombras, ainda acreditam, claro, para proveito próprio, que certos políticos como Lula ou Bolsonaro mereçam nosso beija-mão. Este último, por exemplo, e sobre o que foi escrito sobre sua misoginia, sua lgbtfobia e o seu racismo, não há como contestar. Tem um tal de Google, onde se digitar, por exemplo, “Bolsonaro e as mulheres”, poderão ler coisas tristes, mas verossímeis, apesar que vergonhosas para um Presidente, mas mesmo assim, não acreditarão. Nem depois de lerem estes três autores supracitados, e nenhum deles foi ou é comunista.

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