Por Élida Abreu
Imagem: Alexandre Rosa |
Eu sempre me pergunto quando me deparo com uma pessoa em situação de rua: Onde será que estão os familiares dessa pessoa? Como deve ser a sensação de estar/ter uma casa e não se sentir pertencente a ela? Porque grande parte das pessoas em situação de rua saíram de suas casas por algum conflito ou decepção, nem todo mundo que vive nessa situação é dependente químico ou alcoólatra, nem todo mundo nessa situação oferece algum perigo para sociedade ou para alguém.
Às vezes penso até sobre o quanto estamos, enquanto sociedade, contribuindo para que estas pessoas continuem nessa situação. E isso não é sobre campanhas higienistas como: “Não deem esmola”, ou algo do tipo. É sobre o quanto nos custa caber em caixas, sermos rotulados o tempo todo e medidos pelo sobrenome ou formação acadêmica.
Certo dia conversava com um amigo sobre o quanto o sistema capitalista nos invisibiliza, nos divide e nos afasta de nós mesmos, o quanto estamos obcecados em produzir não para nosso bem-estar, mas para mostrar que temos. Porque estamos na era da exposição, de mais likes e menos afetos e escuta.
E agora eu volto a minha pergunta inicial… O sistema capitalista não tem produzido apenas “mendigos” por dinheiro, tem produzido gente indiferente a gente, a vidas, a existências.
Quantas vezes você se interessou pelo talento de alguém “sem sobrenome”, sem milhões de seguidores ou streams?
Quantas vezes, nos últimos dias você ofereceu escuta e acolhimento, ou foi ouvida e acolhida?
Quantas vezes você se importou com a história ou perda do outro e só se fez presente quando não sabia o que dizer?
Nem tudo que é visto é lembrado.
Fundadora do Coletivo MADA, Élida Abreu é quilombola, poetisa e ativista do movimento negro
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5 Comentários
Estamos em um barco furado. Em um sistema opressor. Não vejo solução.
ResponderExcluirAntigamente alguns comunistas tinha um ditado: “a esmola atrasa a revolução”. A razão, segundo os comunas, apesar da existência desses deserdados ser um subproduto do sistema capitalista, eles jamais se revoltarão se continuarem sobrevivendo com os restos e da benevolência da caridade e piedade de beneficiência, inclusive eleitoreira como alguns pseudos políticos nocivos programas sociais que não passam de ralos para ratazanas eleitos. Além disso, bem perto deles e que ajudam e fabricam esse homeless, está a nociva camada dos lumpemproletariados.
ResponderExcluirNossa, que aula! Uma mistura refinadíssima de Marx de rodapé com pitadas de coach de direita e aquele tempero gourmet de teoria da conspiração. Vamos aos destaques:
Excluir1. "Antigamente alguns comunistas..." – Adoro quando começa assim, parece história de pescador. "Alguns", "antigamente"... fontes? Ah não, era só uma lembrança nebulosa mesmo.
2. "A esmola atrasa a revolução" – Sim, a frase existe, mas você esqueceu de dizer que ela vinha num contexto crítico ao assistencialismo que não emancipa. Só que, curiosamente, quem mais repete essa frase hoje são os que odeiam a revolução. Incrível a ironia, né?
3. "Subproduto do sistema capitalista..." – Reconheceu que o sistema é o criador dos miseráveis, mas o problema é quem tenta minorar o sofrimento deles? Brilhante lógica. Tipo culpar o curativo pelo machucado.
4. "Eles jamais se revoltarão se continuarem sobrevivendo com os restos..." – Então o ideal seria deixar morrer mesmo? Só pra ver se levanta em revolta depois? Uma espécie de darwinismo revolucionário gourmet, é isso?
5. "Programas sociais que não passam de ralos para ratazanas eleitos" – E quem vota contra esses programas geralmente está bem alimentado, com os boletos em dia e o discurso ensaiado no Zap. Mas claro, o problema é o pobre que recebeu R$600, não o bilionário que pegou isenção fiscal.
6. "Lumpemproletariado" – Olha só quem leu uma página do Manifesto Comunista e achou que agora pode dar carteirada. Só esqueceu que Marx usava esse termo para criticar quem era instrumentalizado pela burguesia, não quem recebia auxílio do governo.
Enfim, um show de incoerência com direito a vocabulário rebuscado pra parecer profundo. Mas como diria o ditado moderno: quando você tenta parecer muito inteligente atacando pobre, só revela o quão confortável você está com a desigualdade.
Daria um braço para saber quem são os autores destes dois comentários acima...
ExcluirEu ia não comentar o comentarista que comentou o meu comentário e se esqueceu de comentar o interessante artigo de Élida. Eu não quis ofender ninguém, mas sou bom nisso. Mas acabo comentando o comentarista, aliás gostei muito de suas observações, e o seu humor , e ele ao contrário de mim não leu só uma página do Manifesto Comunista de 1848, mas não sei se leu além dos rodapés das obras do Marx, opa, Karl Marx. Na verdade, eu já li o Manifesto do Partido Comunista, e ainda tenho aqui a edição da Editora Alfa-Omega, V. 1; e tenho aqui uma edição bonitinha da Boitempo, 2010, só que aqui o opúsculo se chama, "Manifesto Comunista", mas não é aí, que o termo "lumpenploretariat" aparece pela primeira vez não - aliás não sei quando isso ocorre-, Karl Marx e Friedrich Engels, os dois autores do Manifesto, 1848, anteriormente haviam mencionado o termo, numa outra obra deles, A Ideologia Alemã, de 1845-1846, minha edição é de 2007 pela Editora Civilização Brasileira. Mas, onde ele utiliza esse termo, lumpemproletarido com mais propriedade será numa obra de sua autoria e em seu pleno amadurecimento crítico e intelectual, de 1852, O 18 brumário de Luís Bonaparte. Dessa obra magistral tenho duas edições, uma de 1978, que gosto mais, editada pela Abril Cultural sob o selo "Os pensadores"; a outra mais moderninha, de 2011, pela Boitempo Editorial. Recentemente, no redemoinho verde-amarelo reli esse "golpe do 18" para pedipaginar com os golpistas bolsonaristas, claro Luís Filipe, o pequeno não é Bolsonaro, o imbrochável, mas os métodos golpistas, mutatis mutandis, não mudaram muito durante o lesmar da humanidade, só que o último não deu certo, ainda.
ResponderExcluirTenho aqui também, duas edições de, O Capital, de 1867. uma delas também pela Boitempo Editorial, de 2013, e a outra, pela Ubu Editora, de 2025. E uma detalhe, "contexto crítico ao assistencialismo que não emancipa", o imperadores romanos também achavam que "o pão e o circo" era emancipador e se a plebe, os eleitores, não se alimentasse com eles, os leões e os gladiadores e os senadores et caterva, nem lembrava e nem via eles, apenas comiam. um espectro ainda ronda o brasil, o espectro do voto útil.
Obrigado por comentar!