Por Rubens Alves Veríssimo
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| Imagem: Divulgação |
Em uma época especial do ano, todo esse ecossistema se encontra em frenesi para celebrar a capital nacional do milho. Organiza-se uma festa que se pretende popular, mas que segrega aqueles que não podem pagar o ingresso dando a eles uma semana de shows e apresentações gratuitos; na outra semana, o local exclusivo para quem pode pagar, é palco de “artistas” de maior relevância (e cachê) nacional, e como não poderia deixar de ser, os hinos dos sertanejos em eterno processo de graduação celebram o orgulho de ser patense.
Em consonância com a economia dependente do campo que indica aversão ao novo e ao diferente está a ausência de diversidade na cidade. Não há mal algum em ter um mercado agropecuário pujante, o problema está na dependência que não permite industrialização diversa ou desenvolvimento de outros mercados que tornem a economia mais dinâmica.
Em episódio recente, a Prefeitura de Patos de Minas decidiu organizar uma roda de conversa a respeito da desigualdade no mundo do trabalho intitulado “Diálogos de Consciência e Carreira”, um esforço para conscientizar, orientar e (talvez?) ouvir os sujeitos vítimas da disparidade social que é perpetuada em nosso país. Um gesto louvável, não fosse uma pequena pedra no caminho que a própria administração do município colocou e tropeçou: as palestrantes eram todas brancas. E o debate que aconteceria amanhã, justamente durante a programação da Semana Municipal da Consciência Negra, por pessoas ditas competentes e escolhidas a dedo por um Executivo que grita a plenos pulmões sua atenção aos pedidos e necessidades da população, não soube montar uma equipe com pessoas três pessoas pretas em um município com aproximadamente 170 mil habitantes.
Por sorte, ou obviedade, a roda de conversa precisou ser cancelada e o mérito é todo de integrantes dos movimentos negros patenses, que não se calaram perante tamanho absurdo.
Esse evento não causa estranheza, uma vez que reflete a incompetência para lidar com o preconceito racial que o nosso país insiste em negar, além da falta de interesse para com as pautas raciais. O episódio em que a Ministra Aniele Franco teve que fazer uma lista indicando profissionais competentes pretos para trabalharem na Pasta de Simone Tebet, pois essa estava tendo “dificuldades” em encontrar tais pessoas, ainda é recente na memória de quem é racializado; já não se pode garantir o mesmo em relação aos brancos, em especial, às três palestrantes brancas que aceitaram ensinar sobre desigualdade aos pretos patenses.
O domínio do mercado por apenas um segmento, a cultura e o turismo da cidade que giram em torno de uma festa anual monotemática, a classe política que apresenta as mesmas proposições de sempre e tem nos bastidores os mesmos atores, tudo isso conversa diretamente com a falta de interesse ao combate ao racismo patense diário. Aqueles que são protagonistas desde quando a cidade era um brejo, ainda querem ser protagonistas hoje.
A ação proposta pela Secretaria de Desenvolvimento Social (SMDS) vai de encontro ao slogan da atual gestão municipal que escreve “O futuro já começou”. Indago como construir o novo cultivando o mesmo pensamento mesquinho e comportamento racista de privar o preto de protagonizar? Porém, talvez realmente estejam construindo o futuro como querem e, como sempre foi, o preto não terá voz política nele.
Rubens Alves Veríssimo é biólogo, escritor, músico e servidor público em Patos de Minas.
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