Autópsia de um poeta

Por Teófilo Arvelos

Imagem: Pixabay

Há pouca fome de poesia
neste país, mas os poucos
famintos de poesia que
aqui existem são insaciáveis:
sempre querem mais e mais
poesia, como se poesia fosse ar,
inerente à vida.

Também sou um desses esfomeados.
Mas também busco escrever poesia.
Isso significa que faço o movimento
completo: consumo a poesia de outros,
produzo poesia para outros.

A poesia que escrevo é, portanto,
transpirada.
Não é inspiração que move a minha poesia.
Inspiração é, por definição,
o que a poesia provoca
ao ser consumida.
O poeta escreve
para inspirar quem o lê.

E, para escrever, o poeta deve ler,
isto é, inspirar(-se).
Um poeta, como um prisioneiro,
nunca consegue sair desse ciclo
(mesmo com comparações e metáforas!),
exceto quando finge ser outra coisa,
qualquer outra coisa que não seja um poeta.

Nesse vaivém de tentativas frustradas
de fingir ser o que não se é
e de ler o que outros fingiram ser
(mas que não o são), o poeta, de repente,
sua. Esse suor, essa transpiração,
é o que se chama poesia.


Teófilo Arvelos é autor dos livros de poesia Parnaso e Lágrima. Atualmente, estuda Geografia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

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