A Maria Madalena de Elias Layon, de Aleijadinho e os Falsários do Templo

Por José Eduardo de Oliveira

 

À Claudia Regina de Deus

 


Em 1945, o francês Germain Bazin [1901-1990], veio ao Brasil pela primeira vez e foi “apresentado” às obras do barroco brasileiro e obviamente ao barroco mineiro também. Foi amor à primeira vista. Segundo ele, “...descobri o Aleijadinho, qual foi meu entusiasmo e de que maneira este encontro mudou a orientação das minhas pesquisas, dirigidas desde então para as manifestações da arte barroca.” [BAZIN, 1971, P. 13].

 Ele que depois seria curador-chefe do Setor de Pinturas do Museu do Louvre, e que como historiador e crítico de arte, antes e depois de suas estadias de pesquisas no Brasil, escreveria inúmeros livros sobre história da arte, inclusive brasileira. E em setembro de 1989, Bazin, esteve no Brasil pela última vez e pronunciou a Conferência de Abertura ao "II Congresso do Barroco no Brasil/Arquitetura e Artes”, que a aconteceu em Ouro Preto-MG.


1-Germain Bazin no II Congresso do Barroco no Brasil/Arquitetura e Artes, em Ouro Preto-MG - 1989.  [BARROCO, 15, P. 10]


Dois livros dele publicados primeiramente na França e depois no Brasil, se destacariam, e doravante seriam e ainda são, fundamentais para o estudo de nossa arquitetura e escultura barroca, “A arquitetura religiosa barroca no Brasil” (1956 e 1958 - Traduzidos apena em 1983) e “O Aleijadinho e a escultura barroca no Brasil”, (1963 - Traduzido apena em 1971). [URIBARREN, 2018, P. 115-119].


Neste livro imprescindível, sobre o escultor mineiro, Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, ele, baseando-se, na “Relação de obras de Antonio Francisco Lisboa”, publicada no livro, “Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho”, editado pela Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1951 [BRÊTAS, 1951.], elaboraria o seu “Catálogo Racional” que seria até então a mais completa relação das obras executadas de autoria comprovada ou atribuídas a ele. [BAZIN, 1971, P. 286-342]. 


É, no momento impossível arrolar toda a bibliografia e referências sobre o escultor e arquiteto mineiro, pois, apenas para se ter uma ideia, em 1970, portanto há 52 anos, Hélio Gravatá fez um arrolado de computou 1.140 títulos e ainda existiam 15 obras em preparo. [GRAVATÁ, 1970]. Mas seguramente, entre todas as obras que hoje devem superar dois milheiros, uma que sempre será fundamental será a de Germain Bazin.


Eu não tenho, a pretensão aqui, com esse relato, sobre Santa Maria Madalena ou como prefiro, sobre Maria Madalena, meio que sem pé e sem cabeça, confuso, cheio de erros diversos, quase barroco, de acrescentar nada a esse necessário emaranhado de escritos e pesquisas sobre o Aleijadinho, e nem pretendo ser preciso e acadêmico, apesar que esse ranço não sai totalmente nunca.


GERMAIN BAZIN, ELIAS LAYON E O SUBLIME

 

Num dia qualquer desse mês deste terrível mês de abril de 2022 - cheio de datas históricas e acontecimentos cruéis como o desenrolar de uma insensata e genocida guerra europeia e em outros lugares, e aqui no Brasil uma insensatez generalizada, em que nossos  políticos os que estão no poder e os que querem voltar ou chegar lá, promovem um verdadeiro e nauseabundo BBB, onde quem vai para o paredão diuturnamente, literalmente, são os brasileiros perplexos e desesperançados – recebi fotos de uma imagem de Santa Madalena  via WhatsApp esculpida por Elias Layon.


E de súbito, vislumbrei aquela imagem e, como Drummond, com “minhas retinas tão  fatigadas”, deixei por um momento minhas desocupações de aposentado e me recordei de uma passagem do livro, do “Aleijadinho” de Germain Bazin, que eu sempre gostei:


Nos últimos anos do século “galante”, no momento em que a Revolução Francesa toma a Europa de assalto, num país perdido, do outro lado do Atlântico, um mestiço, paralítico das mãos ainda por cima, produz esta obra sublime, a última aparição de Deus evocada pela mão do homem. [BAZIN, 1971, P. 271].


Felizmente, Germain Bazin, naquele hoje, longínquo ano de 1963, se equivocou. E o marianense Elias Layon está lá em Mariana e Ouro Preto para testemunhar isso. E, como Aleijadinho, no século XVVIII, Layon, nos séculos XX e XXI, “...anima com um sopro lírico e vitaliza com uma energia a plástica barroca, então esgotada na Europa pelo formalismo e pelo virtuosismo.”  [BAZIN, 1980. p. 284]


Ele de certa forma, como “neobarroco”, é um discípulo de Aleijadinho, do pintor Manoel da Costa Ataíde e de tantos outros, e continua, com suas sublimes obras fazendo evocar a sublime aparição de Deus, de Cristo, das Nossas Senhoras, dos Santos e de toda uma legião de anjos, querubins e serafins... Por exemplo:




2-3-Santa Bárbara e Santana Mestra – fotos de Elias Layon


4- Santo Antônio – foto de Elias Layon

 

E pelo que fiquei sabendo pelo próprio Layon, quando ele tinha mais ou menos 16 anos ele chegou a ver Germain Bazin “várias vezes lá na casa do Lauro Morais diretor do Museu Arquidiocesano” em Mariana, mas não conversaram e nem nada.


Antes de escrever sobre a alumbrada escultura, de Maria Madalena, e apenas para constar, vi Elias Layon pela primeira vez nos primeiros meses do ano de 1982, quando fui morar em Mariana para estudar História no Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Ouro Preto e, depois de pouco mais de um mês me mudaria para Ouro Preto onde moraria até terminar o curso em 1986. Mas sempre retornaria tanto a Mariana quanto a Ouro Preto até 2019, esses burgos oníricos e fantasmagóricos perdidos ora numa bruma suave e doce, ora numa corrubiana inclemente e opressora. Sem nunca computar as pingas, as cervejas e os delírios em meio a ladainhas, badalar de sinos e anjos caídos, de asas quebradas ou um som de verso de Gonzaga, Alphonsus ou os devaneios de Marilia ou da doce insanidade de Ismália. Sem contar as peregrinações a Congonhas e tudo não passou de Vias Sacras sem milagres... Evoé Baco...


Como sempre gostei de artes plásticas, durante esse período sempre entrei e sai de ateliês de pintores, escultores e de artesãos de Mariana, dentre eles, Alcides Ramos, Aloysyums, Álvaro, Beth, Guima, Dalva Ribeiro, Cezário, Edésio, Eduardo Campos, Zulu & Paula, Paglioto, Ladim Gamarano, Lélio, Manoel Chaves, Márcio Silva, Maysylva, Mestre Paiva, Renato R.L.J, R. Lima, Roquinho, Salvador Paixão, Tumão, Vigário, Zizi Sapateiro e Elias Layon. E tantos que vieram depois de minha época. Alguns eu conheci...


Às vezes trocava uma ou duas palavras com aqueles inúmeros e talentosos artistas marianense.  Com Elias não foi diferente, nunca trocamos mais que uma ou duas palavras pessoalmente, apesar de sempre admirar seus trabalhos. Nunca passou disso, tanto é que só recentemente fiquei sabendo que ele era também escultor, restaurador etc. E também que ele é conhecido “como o pintor das brumas”, pois não executa apenas pinturas e esculturas sacras, mas também é um virtuose em paisagens de casarios, becos e montanhas e outras temáticas profanas inolvidáveis.


E faz algum tempo, depois que escrevi algumas coisas sobre o Aleijadinho, e ele leu e gostou, nos tornamos amigos celularais ou whatsappais, se preferirem, apesar de termos personalidades diferentes, tenho uma admiração e um respeito muito grande por ele.

 

A MARIA MADALENA DE ELIAS LAYON

 

E desde então, ele me envia fotos de suas pinturas, suas esculturas e de seus projetos. E uma das últimas foi essa obra-prima, Maria Madalena:


5-Maria Madalena de Elias Layon – Foto dele mesmo.

 

Mas foi exatamente esta última imagem de Maria Madalena, que me fez pensar e pesquisar novamente sobre estas coisas.


Primeiro, por um lapso de memória, eu achava que todas as imagens de santos e santas de Aleijadinho eram representadas calçados, com toscas botinas onde aparecem suas pontas em ângulos retos que às vezes não combinam muito com os corpos das imagens, aliás, este é um dos estilemas de sua talha. O que pode ser constatado também nas três esculturas também de Elias Layon aqui mostradas supra e todas calçadas.


A exceção fica para as imagens em que o Aleijadinho representou seus Cristos, Apóstolos e Anjos que sempre aparecem com os pés descalços. E numa imagem de Maria Madalena que se encontra em Congonhas e que eu havia me esquecido e que em breve tratarei. Algumas poucas imagens aparecerão também usando sandálias.


6-Passo da Prisão – Congonhas – Soldados e apóstolo calçados e Cristo descalço. Foto do autor.

7-Nossa Senhora da Piedade – Caeté-MG – Cristo descalço e Nossa Senhora calçada. [OLIVEIRA, 2002. P. 17]

 

8-São João da Cruz – Sabará-MG – representado usando sandálias. [OLIVEIRA, 2002. P. 17]

 

DIGRESSÃO: QUANTAS OBRAS ALEIJADINHO E O SEU ATELIÊ PRODUZIU? OS CATÁLOGOS E OS CATA LOGO!! 

 

Depois de German Bazin em 1963, alguns autores também ensaiaram uma nova lista de obras, ou um “catálogo racional” que identificasse e listassem todas as obras executadas ou atribuídas ao Aleijadinho ou ao seu ateliê ou oficina. Destacarei alguns.


Em 1979, foi publicado o livro, “Vida e obra de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho”, escrito pelo mineiro Sylvio de Vasconcellos [1919-1979].  Neste precioso opúsculo, Vasconcellos faz não só um “catálogo racional”, organiza a obras de modo a tentar esgotar o assunto, inclusive, arrola, Datas relacionadas com Manuel Francisco Lisboa [seu pai]; Datas relacionadas com Antônio Francisco Lisboa; Obras de Antônio Francisco Lisboa, por tipo; Obras com contribuição de Antônio Francisco Lisboa, por localidade e monumento; Relação de pagamento feitos a Antônio Francisco Lisboa, em oitavas de ouro; Relação de obras documentadas de Antônio Francisco Lisboa. E sempre procurando informar dentro do possível se a obra é documentada ou atribuída.


Em 1995, Márcio Jardim também elaborou seu “catálogo”, “O Aleijadinho uma síntese histórica”. Sua relação consta de 304 obras, e segundo ele, se baseou nos catálogos, da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional de 1951, no de Bazin de 1963 e no de Sylvio de Vasconcelos de 1979. [JARDIM, 1995, P. 182]


Em 2002, apareceria um novo “catálogo”, “O Aleijadinho e sua oficina; catálogo das esculturas devocionais.”, de Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira, Olinto Rodrigues Santos Filho e Antonio Fernando Batista dos Santos.[ilustração 9] Neste catálogo as obras sofreriam um decréscimo, se comparado com as da relação do autor anterior que foi de 304 obras, aqui elas serão apenas 128 obras, já que os autores arrolaram apenas esculturas devocionais, ou seja, imagens onde os devotos depositam sua fé e esperança em forma de orações e súplicas, onde “...as imagens devocionais têm autonomia funcional e representativa, destinadas que são à comunicação direta com os fiéis e a suscitar sentimentos favoráveis à prática cristã.” [OLIVEIRA, 2002. P. 11]



Em 2006, portanto, cerca de onze anos depois, novamente, Márcio Jardim, elaboraria um novo “catálogo”, “Aleijadinho catálogo geral da obra”, onde as obras do Aleijadinho passariam de 304 para 425 obras. [JARDIM, 1995, 322].


Entretanto, cinco anos depois, em 2011, Márcio Jardim, reeditaria o seu “catálogo”, com outro nome, “O Aleijadinho: catálogo geral da obra: inventário das coleções públicas e particulares”. [ilustração 10] Além de uma nova roupagem e uma primorosa edição com centenas de fotos em cores, traria também dois novos coautores: Herbert Sardinha Pinto e Marcelo Coimbra. E, neste livro que quando adquiri achei espetacular, as obras de Aleijadinho também sofreriam um pequeno acréscimo e passariam de 425 para 486. Onde eles mesmos dividiram as obras por espécies, da seguinte maneira: escultura (374), entalhamento (37), escultura ornamental (25), arquitetura (25), marcenaria (24) e sem especificação (1),  localizadas em cidades históricas de Minas e em Museus de S.P., e em coleções particulates. [JARDIM, 2011, P. 304].


Em síntese, segundo os autores,

 

A catalogação da obra do Aleijadinho sempre esteve nas mãos de pesquisadores sérios como Rodrigo Melo Franco de Andrade, Lúcio Costa, Germain Bazin, Zoroastro Vianna Passos, Sylvio de Vasconcellos, Orlandino Seitas Fernandes e Jair Afonso Inácio; continuar a linha estabelecida por eles é o propósito desse inventário.


Foram feitas até hoje sete relações: 1a.] 1858 – Rodrigo José Ferreira Bretas, 101 obras; 2a.] 1951 – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 163 obras; 3a.] 1955 e 1979 - Sylvio de Vasconcellos, 202 obras; 4a.] 1958 [na verdade o certo é 1963] e 1971 – Germain Bazin, 113 obras; 5a.] 1977 – Geraldo Dutra de Moraes, 238 obras; 6a.] 1995 e 2006 – Márcio Jardim, 425 obras; 7a.] 2002 – Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira, Antônio Fernando Batista dos Santos e Olinto Rodrigues dos Santos Filho, 128 obras, relação parcial, restrita a imagens devocionais. [JARDIM, 2011, 10].



Note-se que os autores, não detalharam que a relação de 1995 foi de 304 obras e a desta relação atual foi de 486 obras. E também, segundo o velho e sábio Waldemar de Almeida Barbosa, “O pior é que a lista de trabalhos atribuídos ao Aleijadinho continua crescendo. (…) Não nos esqueçamos também de que houve outros artistas, muitos outros artistas, em Minas, no século XVIII.” [BARBOSA, 1985, P. 44]. Detalhes.

 

DIGRESSÃO 2: DAS FALSIFICAÇÕES E DO MERCADO DA ARTE 

 

Sobre as falsificações na história da arte no decorrer dos séculos, e o bilionário mercado de obras de arte autêntica e/ou falsificadas, existem inúmeros relatos e comprovações algumas vergonhosas, inclusive são elas que fazem um autor continuar produzindo obras-primas Per omnia saecula saeculorum [Até o fim do século]. Sobre a falsificação, Argan e Fagiolo, alerta que, 

 

Não se trata só de um facto especulativo, antes é quase um fenómeno reprodutivo que é estudado numa ótica crítica: cada falsificação denuncia os interesses e a maneira de ver de uma época. [...] No Humanismo existem alguns fenómenos [Ghiberti falsifica moedas, Miguel Ângelo esculpe “à antiga” um Cupido [...] No século XIX, e no nosso século [em que o problema se torna patológico] nasce a mística personalidade do falsário: [...] Hans Van Meegerem provoca o célebre escândalo dos Vermeer. [...] É de notar que a falsificação não é uma obra objectiva [nem a fotografia o é, no fundo] mas um produto confeccionado para uso de um certo consumidor: é simplesmente um sintoma da relação arte-público.” [ARGAN; FAGIOLO, 1994.   P. 136-7]

 

O episódio em que Miguel Ângelo falsifica uma escultura de um cupido, inclusive envelhecendo-a, como fazem hoje em dia aos montes, foi narrado por um  de seus biógrafos, Giorgio Vasari, em “Vida dos artistas”, de 1550. [VASARI, 2011. P. 716]. Já, sobre um dos mais célebres falsificadores, Hans Van Meegerem, a literatura é vasta, mas prefiro listar aqui um filme que esclarece tudo: “O último Vermeer” [The Last Vermeer], dirigido por Dan Friedkin, de 2019.


Muito provavelmente, os catálogos e as falsificações das obras do Aleijadinho começaram de fato, com a publicação em 1858 da primeira biografia de Aleijadinho, “Traços biographicos relativos ao finado Antonio Francisco Lisboa; distincto escultor mineiro, mais conhecido pelo appellido de –Aleijadinho.” Que por sua vez colheu partes de suas informações no “catálogo” elaborado por um vereador de Mariana, Joaquim José da Silva, de 1790. [BRÊTAS, 1951.] Esta biografia ela mesma vem recheada de equívocos, imprecisões e lacunas, o que é perdoável, visto seu pioneirismo. Aliás seu valor é inestimável.


E sobre as falsificações de esculturas do Aleijadinho, só Deus sabe o que é ou foi realmente de sua autoria e de seu ateliê ou de sua oficina.


 Para Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira, “A obra do Aleijadinho tem como referência datadas apenas as imagens de São João da Cruz e São Simão Stock da Igreja da Ordem Terceira do Carmo de Sabará, de 1779, e o conjuntos dos Passos de Congonhas, do período 1796-1799”. [OLIVEIRA, 2002. P. 13]. Trata-se de obras devocionais e também móveis. Já os Profetas de Congonhas – 1801-1805 -, também são datados e documentados, bem como outras obras, que não são devocionais ou passiveis de serem removidas.


E também, segundo ela, 

 

As imagens devocionais incluídas na “Relação de obras de Antônio Francisco Lisboa”, estabelecida em 1951 pelo antigo SPHAN, bem como as relacionadas no item III do “Catalogue raisonne” do livro de Bazin [...] constituem ainda hoje os parâmetros fundamentais para as atribuições ao artista.” [OLIVEIRA, 2002. P. 13].

 

Assim, as atribuições de autoria, quando não há documentação, são feitas comparando os estilemas, ou seja, as características do estilo da obra analisada com as das obras comprovadamente do Aleijadinho, como São João da Cruz e São Simão Stock da Igreja da Ordem Terceira do Carmo de Sabará e os Passos e os Profetas de Congonhas.


Existe também uma curiosidade sobre os estilemas das obras do Aleijadinho, ou seja, as particulares estilísticas constantes em suas obras escultóricas, seja em cedro ou esteatita ou pedra sabão.


Sylvio de Vasconcellos, em 1979, aponta 10 estilemas principais:

 

A identificação das obras atribuídas a Antônio Francisco, sem prova documental, fundamenta-se nas informações do vereador de Mariana, registradas ainda em vida do mestre (1790), e divulgadas, mais tarde, por Bretas, informações estas que se confirmaram por posteriores estudos da matéria. [...]

 


[VASCONCELLOS, 1979. P. 30-31 – Adaptação José Eduardo de Oliveira.] [ilustrações 11 e 12]

 

O curioso é que em 1995, Márcio Jardim, apresenta 13 estilemas; em 2006, 27; e em 2011, 28. Além disso, em 2001, no Catálogo para a exposição, “Antônio Francisco Lisboa o ‘Aleijadinho’ o que vemos e o sabemos”, no Museu Nacional de Belas Artes, os estilemas chegam a 45. [WHITAKER, 2001. P. 64]. No “catálogo”, “Antônio Francisco Lisboa ‘...de mim e de meus oficiais...’”, aparecem 51 estilemas. [LIMA, 2005. P. 102]. E, no Catálogo para a exposição, “Aleijadinho, arte e fé brasileira – ofício divino”, que aconteceu no Museu de Arte Sacra de São Paulo, em 2010, os estilemas são 55. [LIMA, 2010. P. 24]


E, Márcio Jardim, ainda nos admoesta que, para a atribuição de uma obra à autoria do Aleijadinho, devem ser seguidos quatro métodos ou procedimentos: análise documental; análise estilística; análise comparativa [os estilemas] e intuição por impressionismo. Essa última é de lascar o cano, como diria meu pai: “decorre do ‘sentimento’ que inspira a obra ao espectador; este se vê praticamente obrigado a intuir a autoria do mestre, pela impressão que ressalta da obra; extremamente subjetivo...” [JARDIM, 1995, 49]. 


Bom, diante de tantos percalços para decidir sobre a paternidade ou maternidade de uma de Aleijadinho é incrível o que os especialistas ainda apontam como obra do Aleijadinho e outros autores.


A edição do dia 11 de janeiro de 2012, da Revista Veja, trouxe a seguinte matéria assinada por Marcelo Bortolloti: “A multiplicação dos santos”, e a seguinte chamada para a mesma matéria, “A  descoberta no Peru de uma peça atribuída a Aleijadinho aprofunda o mistério sobre o mestre do barroco brasileiro.” E para não continuar com essa história, segundo Bortolloti, quem descobriu a peça em Cuzco foi Marcelo Coimbra, que acabara de publicar um livro em parceria com Márcio Jardim. O livro: “O Aleijadinho: catálogo geral de sua obra: inventário das coleções públicas e particulares”.


Mas voltemos às falsificações, aliás, a uma, que foi denunciada em matéria de capa do Jornal Estado de Minas, “Aleijadinho – Arte Adulterada”, na edição de 4 de maio de 2014, do jornalista Gustavo Werneck. Na própria capa, além do título em caixa alta, vem estampado:

 

No ano do bicentenário da morte de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), Ministério Público e autoridades federais estão em alerta para a proliferação de cópias, objetos sacros “envelhecidos” e peças de coleções feitas por outros escultores atribuídas ao gênio. Além de um atentado à cultura, trata-se de crime de estelionato. A denúncia mais recente é do artista plástico Elias Layon, de Mariana. Layon identificou duas imagens feitas por ele “São Joaquim e Nossa Senhora da Expectação” no livro O Aleijadinho  Catálogo geral da obra/Inventário das coleções públicas e particulares. Avisada, a presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Jurema Machado, disse que será formada comissão de especialistas para consolidar informações sobre toda a obra do mestre. [Estado de Minas, 2014, p. 25]


Layon ao tomar conhecimento do livro e da publicação de suas réplicas como obras do Aleijadinho, ele que é um dos maiores admiradores do escultor, obviamente não gostou e desabafou:

 

“É um absurdo, uma desmoralização ao patrono das artes no Brasil.”


O motivo da irritação do artista, conhecido como “pintor das brumas”, está em duas páginas de O Aleijadinho – Catálogo geral da obra/Inventário das coleções públicas e particulares, de autoria de Márcio Jardim, Herbert Sardinha Pinto e Marcelo Coimbra, com quase 500 peças fotografadas e descrições detalhadas. Layon se declara autor de São Joaquim, de 23 centímetros de altura e esculpido em madeira – o original de Antonio Francisco Lisboa se encontra no Museu Arquidiocesano de Arte Sacra de Mariana – e de Nossa Senhora da Expectação, de 22cm, também em madeira. A relíquia verdadeira é fruto da oficina de Aleijadinho, e não propriamente do mestre. Curiosamente, as duas peças originais, em que o escultor diz ter se inspirado, também estão publicadas no catálogo. “São Joaquim e Nossa Senhora da Expectação”


“Aleijadinho não merece tal afronta, nem eu mereço semelhante glória. Esculpi as duas imagens na década de 1980 e as vendi, explicando que eram cópias. Para minha surpresa, vi no livro que rasparam meu nome, mudaram a policromia e ainda amputaram o braço direito de São Joaquim”, conta o artista, que aponta, na foto do livro, um pino na madeira característico de seu trabalho. [Estado de Minas, 2014, p. 25]


Pelo que se depreende desse caso, é que, o escultor Elias Layon fez e faz, foi valer-se de Aleijadinho como modelo, e no caso fez uma cópia, ou uma réplica, não uma falsificação – como outros artistas de Ouro Preto e Mariana fazem - e deixou isso bem claro ao assinar a obra, coisa que Aleijadinho ou nenhum escultor de sua época fazia, ou seja, não assinavam suas obras. Eu disse que ele fez e faz, muitas vezes, inclusive usando os estilemas do Aleijadinho, como tantos outros artistas através dos tempos, fizeram, primeiro de seus mestres depois de outros que admiravam. 


Elias Layon, por exemplo, em sua Maria Madalena, pode ter usado alguns estilemas de Aleijadinho, mas é indubitável a originalidade de sua Santa. E o próprio Aleijadinho usou modelos europeus em suas imagens e até mesmo conjunto de imagens, como os Passos da Paixão e os Profetas, mas a originalidade de suas imagens e o seu estilo pessoal é que o tornou o que conhecemos. 


Pode parecer exagerado, mas é o que penso, Aleijadinho está para Layon, o que Lorenzo Ghiberti foi para Aleijadinho, pelo menos em se tratando dos púlpitos de São Francisco de Assis de Ouro Preto, sobretudo, como nos aponta Lourival Gomes Machado, na questão da “Inspiração e Cópia”, “Poderíamos multiplicar exemplos de como, recusando-se à cópia pura e simples e, também, à modesta redistribuição de formas alheias em nova moldura, Antônio Francisco Lisboa obedece ao ímpeto criador mesmo quando se vale de modelos.” [MACHADO, 1991, P. 241]


E a falsificação aconteceu quando os compradores das imagens as adulteraram e além disso, autenticou-as atribuindo-as ao Aleijadinho. E isso tudo dentro daqueles sagrados estilemas.


Aliás, quando essa coisa veio à tona, eu já havia adquirido o livro, como se tivesse adquirido um tesouro, uma obra-prima. As disposições e as qualidades das fotos, os textos e documentos, para mim, tudo fazia daquele livro o melhor e mais bem acabado livro de História da Arte do Brasil de todos os tempos. Anteriormente, havia adquirido outra obra que também foi impressa com grande esmero gráfico, “O Aleijadinho e sua oficina; catálogo das esculturas devocionais”. Mas que tinha ficado agora em segundo lugar.  Que decepção.


Depois fui observar melhor este “catálogo”, que infelizmente - mesmo para servir de exemplo e abrir os olhos, para alguns “ouros de tolos” – tornou-se indispensável.



13-14-Nossa Senhora da Expectação - a primeira é atribuida ao Aleijadinho a segunda é de Elias Layon -  [JARDIM ET AL. 2011 – P. 209 e 283]



15-16-São Joaquim – a primeira é atribuida ao Aleijadinho a segunda é de Elias Layon  - [JARDIM ET AL. 2011 – P. 70 e 211]

 

Entretanto, a imagem de São Joaquim, de Elias Layon, vem há muito tempo aparecendo, não só em outros livros de Márcio Jardim, [JARDIM, 1996, Figura CGO-111], [JARDIM, 2006, Figura CGO-316, P. 295],  mas também em catálogos e exposições como sendo uma obra atribuida a Aleijadinho: “Antônio Francisco Lisboa o ‘Aleijadinho’ o que vemos e o sabemos”, [WHITAKER, 2001. P. 29]; também em, “Antônio Francisco Lisboa; O Aleijadinho”.[WHITAKER, 2002. P. 32]; Idem, “Aleijadinho e Mestre Piranga: processos de atribuição e história da arte.” [WHITAKER, 2003. P. 40]; e também no “catálogo”, “Antônio Francisco Lisboa ‘...de mim e de meus oficiais...’”, [LIMA, 2005. P. 40]. E, e finalmente, no Catálogo para a exposição, “Aleijadinho, arte e fé brasileira – ofício divino”. [LIMA, 2010. P. 63]


Eu escrevo essas coisas porque gosto, mas não tenho os olhos de perito e não sou bom para atribuições, mesmo convivendo há décadas com essas imagens. E também, os falsários, segundo uma anedota de quem é do ramo, “fazem melhor que os próprios artistas”. E nem possuo aquela “intuição por impressionismo”, como escreveu Márcio Jardim, uma espécie de metempsicose que me ensine a determinar a autoria de obras de arte só pela sua aura. Mas mesmo como leigo, quando corri os olhos mais atentamente novamente naquele “catálogo”, diante de algumas imagens, que os autores espremeram ali, cheguei à conclusão de que o pobre do Aleijadinho deveria ser era cego quando esculpiu algumas daquelas tristes imagens sagradas, e não aleijado. E conclui também, que aqueles veneráveis senhores se pudessem colocariam ali, que até a estátua do Cristo Redentor foi esculpida por Aleijadinho, se não tivesse sido feita no Rio de Janeiro...


E por que falsificam obras de arte? Não acho que seja “simplesmente um sintoma da relação arte-público” como Argan pensa. Assim como um em cada dois políticos se corrompem por causa de dinheiro e tudo que ele pode trazer, inclusive obras de arte. Acontece também com os falsificadores, é só surgir um artista consagrado, que surgem dois ou três falsários gananciosos por dinheiro e tudo o que ele traz, inclusive obras de arte autênticas, suponho. Mas principalmente, lucro fácil que os parasitas mais gostam. Sem contar, é claro, com a “Vanitas vanitatum, et omnia vanitas.” [Vaidade das vaidades, e tudo é vaidade. Eclesiastes, 1:2], cravado no nártex da São Francisco de Assis, [e de Aleijadinho] por Manoel da Costa Ataíde, admoestando não só os cristãos verdadeiros, mas os escribas, os fariseus, os fabricadores, os vendedores e os compradores de arte falsa.


Não precisei ir longe, ao acaso, descobri um pedaço de uma edição da revista Veja de 6 de setembro de 1989, com a seguinte matéria: “Lucro barroco: Aleijadinho bate recorde no mercado da arte”.  A matéria diz que “o marchand e antiquário carioca Johnny Chartouny vendeu por 830.000 mil dólares [hoje, cerca de R$ 4.100.000,00] a imagem Cristo da Ressurreição, em madeira policromada no século XVIII e atribuída a Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.” E que “o preço foi o mais alto já pago por uma obra de arte no país. A peça foi autenticada em 1965 pelo perito Orlandino Seixas Fernandes, ex-diretor do Museu de Ouro Preto”. [VEJA, 1989, P. 113] E curiosamente essa imagem não consta no “catálogo” de Márcio Jardim et caterva. Mistérios...


17-Cristo da Ressurreição – Veja 1989.

 

Em 2005, Renato de Almeida Whitaker, colecionador de obras de arte e possuidor de inúmeros “Aleijadinhos”, inclusive do “Aleijadinho de Elias Layon”, faz uma ferrenha defesa da autenticação de suas obras, e critíca da mesma forma o livro “O Aleijadinho e sua oficina; catálogo das esculturas devocionais” de Myriam Oliveira e outros, sobretudo nas questões de atribuição de autorias das obras de seu acervo. Em seu texto, traz também, uma matéria em fac-símile que foi publicada no jornal o Globo [14.04.2000], “Isto é Aleijadinho? Denuncias de peças falsas mostra que obras do mestre continuam mal catalogadas.”  Em que, pasmem, ele aponta erros grosseiros, da imagem do “Cristo da Ressurreição”, de propriedade de Antônio Maluf. [Renato de Almeida Whitaker, apud, LIMA, 2005, P. 87-100]


Mas retomemos a questão da Santa Maria Madalena e seus pés descalços.

 

MARIA MADALENA DE ALEIJADINHO

 

18-Santa Maria Madalena – Passo da Crucificação – Congonhas-MG -Foto José Eduardo de Oliveira- 2014.

 

Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, nasceu em Vila Rica, atual Ouro Preto, provavelmente em 1738 e morreu na mesma vila em 1814.  Considerado um dos maiores ou o maior artista plástico brasileiro. Foi escultor e arquiteto e suas obras estão em várias localidades, sendo que as principais se encontram, em templos religiosos e de peregrinação e museus das atuais cidades de Ouro Preto, Congonhas, Sabará e São João del Rei. E, em museus, coleções particulares e no mercado negro dos vendilhões da arte falsificada.


Projetou e executou principalmente, templos religosos, chafarizes, retábulos, lavabos, portadas, púlpitos, frontões e custódias. Como toreuta, esculpiu, entre baixos relevos e imagens religiosas, inúmeros santos, santas, anjos e inúmeros figuras de Cristo, sempre do Novo Testamento, exceto, os Profetas de Congonhas que são do Antigo Testamento. E suas principais matérias primas utilizadas para plasmar suas esculturas e obras de talha em geral foram principalmente duas: o cedro e a pedra sabão ou esteatita.


Entre tantas Santas e Nossas Senhoras [Da Piedade, do Carmo, Mercês, Santana Mestra, Rosário…], apenas uma Santa Maria Madalena. E ela se encontra numa Capela  dos Passos da Paixão do Santuário do Senhor Bom Jesus de Congonhas em Minas Gersais. Ressalte-se que ele não escolhia que obra executar, pois como todos os artistas daquela época trabalhava principalmente sob encomenda de igrejas e ordens religiosas ou para leigos religiosos. E assim transformava madeiras e pedras brutas em imagens sublimes que poderiam garantir a salvação pelo culto e pela fé.


Neste Santuário existem seis capelas contendo sete Passos da Paixão ou Via Crucis: Ceia, Horto, Prisão, Flagelação e Coroação de Espinhos, Cruz às Costas e Crucificação. Depois de prontos, levariam muito tempo para serem pintados e encarnados, em cuja policromia participariam, pelo menos em parte, Manoel da Costa Ataíde [1762-1830] e seu discípulo Francisco Xavier Carneiro.  Os Passos, em tamanhos semelhantes aos dos corpos humanos, foram esculpidos em cedro por Aleijadinho e sua oficina ou ateliê - alias, composto por escravos, inclusive, sendo ele um pardo, filho de escrava -, de 1796 a 1799, entretanto, as capelas só ficariam prontas em 1875. Posteriormente Aleijadinho também e sua equipe esculpiriam os Doze Profetas no adro da Capela do Santuário do Senhor Bom Jesus de Congonhas entre 1800 e 1805. Eles foram executados em pedra sabão em tamanho muito maior que ao de um homem comum.  [TAVARES, 1972, P.35-55.]


Maria Madalena encontra-se no ultimo Passo, o da Crucificação, e é uma das três figuras femininas que aparecem em todos os passos. Em um documento datado de 18 de julho de 1875,  quando os Passos ficam prontos e com suas imagens ordenadas, assim é descrito esse Passo: “Passo da Crucificação – 1 Imagem do Senhor crucificando-se/1 Dita de Santa Maria Madalena/10 figuras em vulto entre grandes e pequenas.” Hoje, lá só existem onze imagens, uma foi para outro Passo. As outras duas mulheres aparecem no penúltimo passo, o da Cruz às Costas, e são denominadas, “Mulher de Jerusalém com criança” e “Mulher chorosa”.  E assim é descrito: “Passo do Senhor com a Cruz-às-costas -  1 Imagem do Senhor com a cruz às costas, grande/ 1 Dita de Nossa Senhora/7 figuras em vulto grande.” [OLIVEIRA,1984. P. 28-9]


19-“Mulher de Jerusalém com criança” e “Mulher chorosa” – Passo Cruz às Costas – Congonhas-MG -Foto José Eduardo de Oliveira- 2014. [Elas e os soldados romanos estão calçados e Cristo descalço.]

 

German Bazin,  ao fazer a análise das duas mulheres do Passo Cruz às Costas no diz o seguinte:  “Uma outra figura foi esculpida pelo Aleijadinho – a da santa Mulher que chora; em compensação, a outra que carrega uma criança é bastante desajeitada:  o artista que a esculpiu imita o ‘pega-rapaz’ e os cachos caindo sobre a testa do Aleijadinho.”  […] Sobre a Maria Madalena, da Crucificação, nem uma palavra, apenas que: “Todas as outras estátuas são ridículos fantoches, em que nada recorda o Aleijadinho.” [BAZIN, 1971, P. 337]


Poderia fazer outras citações em que alguns discordam outros concordam que Maria Madalena foi esculpida por discípulos, outros que foi o próprio Aleijadinho, como essa: “Alguns críticos afirmaram que o Aleijadinho só se ocupou pessoalmente com a execução das seis figuras de Cristo, da de Maria Madalena e das de alguns apóstolos.”  [MANN, 1973. P. 38]. Isso  nunca terá fim, o que não deixa de ser salutar.


Mas me ocuparei agora com um detalhe importante, e que aliás me inspirou a escrever essas coisas aqui, Maria Madalena é a única imagem feminina representada descalça, com comprovação documental e datação de Aleijadinho que aparece em todas as suas representações, isso se fiarmos nos Catálogos de Myriam Oliveira e Márcio Jardim. Além disso essa escultura possui outras peculiaridades que destacarei logo a seguir. [OLIVEIRA, 2002. P. 96; JARDIM, 2011, P. 174] 

 

AS PECULIARIDADES DE MARIA MADALENA DE ALEIJADINHO

 

20-Passo da Crucificação com todas as suas 11 imagens – [OLIVEIRA, 2011. P. 104-105]


A primeira peculiaridade dessa imagem de Maria Madalena tão singular, já foi descrita aqui, ela é a única imagem devocional feminina com comprovação documental e com datação, representada descalça, feita por Aleijadinho.


A segunda, é que se ela hoje, está exposta na Capela do Passo da Crucificação e se apresenta mostrando sua face direita com o pé descalço,  em sua face esquerda, ela se apresenta com o pé calçado, e  poderia ser vista assim se a imagem fosse mostrada frontalmente ou pelo lado esquerdo.



21-22-Maria Madalena no Passo da Crucificação – [OLIVEIRA, 1984. P. 53]

 

Myriam de Oliveira, em seu livro, “Aleijadinho Passos e Profetas”, assim descreve esse Passo e Maria Madalena,

 

Ao contrário do que se verifica nos outros Passos, as onze imagens que formam o grupo da Crucificação não se acham subordinadas a um único foco de interesse, sendo a composição dividida em três zonas distintas, à margem de um tríptico.  A zona central, onde se passa a ação principal, é ocupada pela figura do Cristo, que dois carrascos pregam à cruz estendida horizontalmente, tendo ao lado a Madalena de joelhos, o olhar voltado para o alto em desesperada súplica. [...]


Além das imagens do Cristo e do Mau ladrão, normalmente admitidas como sendo da mão de Antônio Francisco Lisboa neste grupo, nota-se ainda sua intervenção direta na talha de três outras figuras, feitas em colaboração com o ‘atelier’’: o Centurião [...] o Bom ladrão [...] e finalmente a Madalena, de penteado análogo ao da Samaritana da fonte do mesmo nome. [...] Esta última imagem constitui um dos melhores exemplos de estátua feita com em colaboração no conjunto dos Passos: concebida para ser vista de perfil, a Madalena é magnificamente talhada do lado direito, a ser divisado pelo espectador, e grosseiramente acabada o outro, que apresenta inclusive erros de proporção, notando-se ainda o curioso detalhe do pé calçado, em contradição com o pé descalço do outro lado. [OLIVEIRA, 1984. P. 50]

 


23-24-Madalena de Elias Layon e Madalena de Aleijadinho – Os pés descalços e as mãos e os olhos em dolorosas súplicas. [Fotos Elias Layon e José Eduardo de Oliveira]

 

Recordemo-nos, da Maria Madalena de Elias Layon, além dela estar descalça, o que não é propriamente um atributo dessa santa, exceto se pegarmos a do Aleijadinho como modelo, ela nos apresenta sim, os atributos que é peculiar em todas as suas representações que são as súplicas, com as mãos ou com os braços os olhares em desespero e dor, em todas as passagens finais dos Evangelhos em que participa, em que ela está presente, seja da Crucificação, quando ela se agarra  pés da Cruz, seja do descimento da Cruz, do Sepultamento e posterior tentativa da unção do corpo do Senhor em seu túmulo, ou da última aparição de Jesus Cristo durante/antes a sua Ascenção. E também, de outras passagens, que consideram ser ela a participantes, como o apedrejamento da mulher adúltera e o lava-pés de Cristo em Betânia.


Outras representações Santa Maria Madalena trazem os mesmos atributos representados de acordo com a visão pessoal de cada artista.  Algumas possuem semelhanças com a do Aleijadinho, ou essa abaixo que se assemelha à de Layon que apresenta as mãos juntas em súplicas.


25-Maria Magdalena. Sepelio de Cristo de la Abadia de Solesmes. [In: BAZIN, 1972. P. 331.]

 

Essa outra, de joelhos se assemelha à do Aleijadinho, e é atribuído a outro grande escultor mineiro do século XVIII, Francisco Xavier de Brito, e um detalhe, seus pés estão cobertos pelas suas vestes.


26-Santa Maria Madalena - Atribuído a Francisco Xavier de Brito – [MAGALHÃES, 2006. P. 159]

 

A terceira peculiaridade, não é iconográfica ou formal, é uma especulação feita por alguns pesquisadores de que se esta imagem deveria estar mesmo no Passo da Crucificação ou em outro?

Para Luís de Moura Sobral, em seu artigo, “A Madalena da Crucificação de  Congonhas: uma discrepância iconográfica ou um passo esquecido?”,  para ele Maria Madalena de Aleijadinho,

 

...não se integra narrativamente no episódio e isto seja qual for a posição por ela ocupada em relação ao Cristo estendido na Cruz.


A Madalena tem joelho direito pousado no chão e os dois braços estendidos, estando o esquerdo mais elevado e praticamente paralelo à perna esquerda. A cabeça está erguida com os olhos em contemplação de algo que se está a passar mais acima. Contrariamente ao que seria legítimo esperar, tão-pouco a Madalena se comove com a brutalidade da cena que se desenrola mesmo à frente dela. Teremos então de concluir eu a interpretação que presidiu ao arranjo desse Passo vê a Madalena como intermediária entre o Filho, miseravelmente estendido na cruz e Deus Pai invisível nas alturas. [SOBRAL, 1982/3. P. 191]

 

E depois de vários arrazoados, alguns nem tão pertinentes assim, Sobral conclui que,


Ou o Aleijadinho se enganou na Madalena, ou alguém dentre os diferentes responsáveis pelo Santuário de Congonhas se enganou na Madalena e no Passo, já que não me parece provável eu que a Madalena se tivesse enganado, por si só, de episódio. [...] . [SOBRAL, 1982/3. P. 195]

 

E que Aleijadinho não podia, por conseguinte ter concebido esta Madalena para a Crucificação e nenhum outro Passo daqueles, mesmo sendo colocado lá por alguém do Santuário.  E ele então pergunta: para quê, por que foi realizada esta escultura?


Sua conclusão, tendo conhecimento de que o projeto inicial previa não só a construção dos Passos da Paixão, mas também os Passos da Ressurreição, é de que, “a Madalena de Congonhas corresponde iconograficamente ao Passo da Crucifixão, ou seja, Cristo pregado na Cruz no Calvário. [SOBRAL, 1982/3. P. 195]


E para corroborar suas hipóteses, nos apresenta esta imagem de  Georg Petel, como sendo, “um correspondente exacto da imagem de Congonhas”,  e que está exatamente onde ele acha que deveria estar a Maria Madalena de Aleijadinho, aos pés da Cruz.


27-Maria Madalena aos pés da Cruz – Georg Petel – C. 1625 – [In: SOBRAL, 1982/3]

 

Depois desse estudo de Luís de Moura Sobral, vários autores, inclusive Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira retomam esse e outros problemas desse controvertido Passo.


Segundo ela, 

 

A inusitada posição da figura da Madalena nesta cena [de joelhos e com os olhos voltados para o alto em atitude de desespero] chamou também a atenção do historiador Luís de Moura Sobral, que apresentou interessante comunicação sobre o tema [A Madalena da Crucificação...]. [...]


Não é difícil concluir que os personagens que aparecem atualmente deslocados no grupo da Crucificação de Congonhas teriam sido originalmente concebidos para integrar uma cena de Calvário não concluída, provavelmente para o camarim da ´igreja principal´, como no Santuário de Braga.


E ela cita a representação de “Bom Jesus”, no Calvário dos Passos do Santuário de Braga, Portugal. E aí, realmente, Madalena diante de Cristo Crucificado se assemelha à Madalena de Congonhas. [OLIVEIRA, 2001. P. 89-90]


28-Madalena aos pés da Cruz – Senhor Bom Jesus do Monte -Braga [https://www.pinterest.pt/pin/395472411016071192/]]


Márcio Jardim também discorre sobre esse Passo da Crucificação e sobre essa mesma questão de Maria Madalena,  

 

 phatos [sofrimento] da escultura é notável e dele podemos dizer, observando-se a expressão de dor e litania que ressalta do rosto o mesmo que Padre Antônio Vieira de imagem semelhante: dor intensa e intrínseca. Panejamento acabado e excelente anatomia do pé direito [...] A escultura representa a Santa sem véu, ajoelhando-se, abrindo os braços em súplica [Supplices preces]  na direção de alguém que estaria acima de linha dos seus olhos e que só pode ser Deus-Pai, tendo em vista estar Jesus deitado ao chão. [...] Parte da historiografia [Sobral] supões que esta imagem pertenceria a um outro Passo não construído, o que não pode ser provado. [JARDIM, 2006. P. 145-146]

 

MARIA MADALENA NO CINEMA

 

Talvez dos personagens bíblicos, provavelmente, foi Jesus Cristo o que mais protagonizou as histórias da Bíblia no cinema e, logicamente, Maria Madalena esteve em todos eles. Ficarei aqui apenas com dois deles, um do século passado e outro desse século. Não só pela polêmica – que não nos interessa aqui - que as duas obras cinematográficas suscitaram, mas também pela beleza e interpretação das duas madalenas das películas. Depois escreverei algumas palavras, sobre um outro  filme, uma ficção, cujo cerne narrativo é a história de Maria Madalena.


29-Maria Madalena/Barbara Hershey atraindo Jesus para seu catre de pecados. Ilustração do filme.


O primeiro é, A Última tentação de Cristo [The Last Temptation of Christ.], dirigido por, Martin Scorcese, de 1988. Neste filme, quem interpreta Maria Madalena é a atriz californiana, Barbara Hershey. E, Cordeiro de Deus que tirai os pecados do Mundo, perdoai-me, a Madalena/Barba Hershey foi a verdadeira personificação do pecado e da lascívia e da luxúria numa só entidade feminina e ao mesmo tempo prenhe de paixão e ternura. Tal qual ela é representada no mundo dos homens e das mulheres, como uma prostituta, uma pecadora, sem que ela, Maria Madalena, nunca tenha sido citada como tal em nenhuma passagem dos Santos Evangelhos Bíblicos. Assim, a tentação tentou mais que a serpente, pois não ofereceu o “fruto do bem e do mal”, ofereceu a carne, que pode ser do bem e do mal, Jesus, como Eva, não teve escolhas, nessa versão cinematográfica, baseada em um livro homônimo do grego Nikos Kakantzakis. Ela não precisou tirar os sete véus para mostrar seus sete demônios espalhados por sua epiderme côncava e convexa lúbrica e desejada. Mas apesar de sua aparência pecaminosa e estonteante, ela estava perdida, naquele mundo em perdição, havia perdido o homem, o carpinteiro Jesus e estava amaldiçoada e rejeitada de certa forma, pelo mesmo divino Jesus.


30-Maria Madalena/ Mônica Bellucci durante sua peregrinação na Via Sacra. Ilustração do filme.


O outro filme é, A Paixão de Cristo [The Passion of the Christ], dirigido por, Mel Gibson, de 2004. Neste filme quem interpreta Maria Madalena é a atriz italiana, Mônica Bellucci, provavelmente uma das atrizes mais belas e sensuais das que apareceram no cinema das últimas décadas. Apesar de já haver atuado em diversos filmes, inclusive picantes, será no filme, Malena, de  2000, dirigido por Giuseppe Tornatore, que ela nos mostrará toda sua malícia e sensualidade.  Quase uma “puttana”, quase, quase uma Maria Madalena antes do arrependimento.


31-Mônica Bellucci, uma Malena, quase uma Maria Madalena. Ilustração do filme.


E se no filme de Mel Gibson ela interpreta não só uma “Madalena arrependida”, mas uma Madalena, que faz da via sacra de Cristo, a sua própria, que em seu silêncio de dor, nos mostra toda a contrição e fé por Aquele que se dirige naquele momento de dor e paixão, não para vida eterna, mas a morte terrena, para tirar os pecados mundo. Madalena/Bellucci só não sofre mais que Maria, porque a dor de mãe é inigualável, insofismável.


Mas antes da crucificação, no filme, Maria Madalena aparece como a mulher adúltera que é redimida por Jesus Cristo, e assim, nenhuma pedra é atirada.


32-A última Ceia de Leonardo da VinciDivulgação.


O terceiro filme é, O Código Da Vinci [The Da Vinci Code], dirigido por, Ron Howard, de 2006, e que foi baseado no livro homônimo de Dan Brown, de 2003. Neste filme quem interpreta Maria Madalena é a atriz inglesa, Charlotte Graham, que aparece apenas em flashback. Apesar de basear-se na história de uma personagem bíblica, Maria Madalena, este filme é uma das histórias mais mirabolantes e inverossímeis em todos os sentidos. Mas todas as histórias que envolvem o humano e o sagrado não são mirabolantes e inverossímeis? E o mais paradoxal é que dos grandes e pequenos artistas da era cristã, provavelmente, Leonardo da Vinci foi o único que não representou em nenhuma nem em pintura e nem desenho, a figura de Maria Madalena. ZOLLNER, , 2008.] Mas, para fundamentar toda a história é usado o afresco A Última Ceia de Leonardo da Vinci.


33-No filme, o apóstolo João à direita de Jesus seria Maria Madalena. Ilustração do filme.

 

Na história, Maria Madalena não só era um dos doze apóstolos de Jesus Cristo que participa da Última Ceia, mas era também esposa dele de quem ficaria grávida. E, no meio dessa explanação, a protagonista pergunta, “A prostituta?”.

 

QUEM FOI MARIA MADALENA?

 

Antes, queria fazer um comentário sobre a iconografia dessa emblemática, importante e porque não dizer enigmática Santa na hagiologia cristã, que em cerca de vinte séculos, foi amada, odiada e por fim consagrada merecidamente. E nesse período, além dos livros sobre ela, inúmeros artistas, sejam pintores, gravuristas, escultores, arquitetos, artesão a representaram Urbi et orbi [À Urbe (= Roma) e ao mundo.] cristão.


Um exemplo, é esse de um dos maiores escultores de todos os tempos, Miguel Ângelo, que a representou nessa polêmica obra-prima, Pietà:


34- “À semelhança da Capela Paulina, as figuras que compõem a Pietà de Florença não respeitam de forma cega as regras de proporção e escala. Assim, Nicodemos é significativamente maior do que Maria Madalena e a Virgem Maria que sustentam o corpo de Cristo à esquerda e à direita. [...] Danificada a Pietà depois reconstruída peça por peça por Tibério Calgni, aluno de Miguel Ângelo...” [ZOLNER, 2008, P. 391, 393.]


Entretanto, procurei, como devem ter observados, em homenagem ao mestre Antônio Francisco Lisboa e à Elias Layon ilustrar apenas com esculturas de Santa Maria Madalena.


Maria Madalena é citada nos quatro Evangelhos, sempre como discípula, ou como alguns autores a denominam, como apóstala de Jesus Cristo.   Mas ela aparecerá em biografias, estudos gerais, no cinema e até “nos becos e vielas”, como cortezã, prostituta e pecadora em geral. Ao acaso peguei algumas referências sobre ela.


Primeiro em uma publicação que vendem em bancas de revistas, “Santo do Dia”, em dose números, um para cada mês, e que por sua vez, cada santo ou santa tem o seu dia, e Santa Maria Madalena é cultuada no dia 22 de julho:

Existe uma controvérsia de fatos quanto a história de Maria Madalena, isso porque enquanto a Igreja Latina tem o costume de celebrar na sua liturgia as três Marias (Maria Betânia, Maria “pecadora” e Maria Madalena) citadas no Evangelho, os redatores do novo calendário acreditam, assim como São Gregório Magno, na existência de uma única e mesma Maria.


Maria Madalena nasceu em Magdala, na Galileia, mas poucas informações se têm sobre a trajetória dessa santa. O mais importante fato de sua vida foi a redenção dos seus pecados que aconteceu durante o banquete em que Jesus participava e Maria derramou sob seus pés perfumados unguentos e depois os enxugou com seus próprios cabelos.


Maria Madalena segue constantemente seu mestre até os pés da cruz e depois acompanha seu sepultamento. Como recompensa ela presencia a sua Ressurreição. (...) [SANTO DO DIA JULHO. P. 21]

 

A outra referência é de Nilza Botelho Megale, que já escreveu interessante, “112 Invocações da Virgem Maria no Brasil”, em sua obra, “O Livro de Ouro dos Santos; vidas e milagres dos Santos mais venerados no Brasil”, nos diz o seguinte sobre Santa Maria Madalena:

 

Pecadora, provavelmente prostituta, foi purificada por Cristo e, como prova de seu amor, passou a acompanhar Jesus e os apóstolos, servindo-os em suas necessidades. Foi testemunha de todas as fases da vida e da pregação do seu Mestre, inclusive a crucificação, morte e ressurreição.

Santa Maria Madalena, irmã de São Lázaro e Santa Marta, era natural de Magdala (...)


Alguns hagiólogos contam que, após a Ascenção, Madalena se mudou para Éfeso, permanecendo com Maria Santíssima e São João. Uma lenda conta que desembarcou nas costas da Provença com seu irmão Lázaro e sua irmã Marta e se retirou para Sainte Baume, perto de Marselha, onde morreu em 22 de junho (sic), data de sua festa.


Santa Madalena é considerada um exemplo de arrependimento e de fé, e foi esta fé que a salvou. Uma das santas mais populares, na arte sacra é geralmente representada ajoelhada junto à cruz, onde Jesus expirou, enxugando as lágrimas com um lenço. [MEGALE, 2003, P. 166-7]

 

A terceira referência, se destaca, por ser de dois especialistas em arte barroca em geral e em Aleijadinho em particular, Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira e Olinto Rodrigues dos Santos, “Glossário de Iconografia”, constante no livro, “Barroco e rococó nas igrejas de São João del-Rei e Tiradentes”, traz o seguinte verbete:

 

Santa Maria Madalena (século I) Maria Madalena assim se chama por ter nascido em Magdala, cidade localizada na costa ocidental do mar da Galileia. Presença constante na vida do Cristo, é identificada como a pecadora que ungiu os seus pés. Esteve na Crucificação e, com outras mulheres, encontrou a tumba vazia. Na tradição, é representada como uma pecadora convertida e penitente, vestida com túnica longa e manto, ou como cortesã, em trajes mundanos com decote e joias. Em Minas Gerais, comumente figura no grupo escultórico do Calvário, junto a Nossa Senhora das Dores, São João Evangelista e o Cristo Crucificado. [OLIVEIRA; SANTOS, 2010, P. 171.]

 

A quarta referência é uma legenda de uma imagem da Santa, no livro, de João Marino, “Iconografia de Nossa Senhora e dos Santos”:


Santa Maria Madalena – Irmã de Marta e de Lázaro, amigos de Jesus, sua festa é no dia 22 de julho. Foi a pecadora que ungiu os pés de Cristo na casa de Simão, o leproso.


Seu atributo pessoal é um vaso de perfumes com os quais lavou os pés de Jesus. Na representação do Calvário, está sempre presente ao lado de Maria Santíssima e de São João Evangelista. [MARINO, 1996, P. 128]


35-Santa Maria Madalena – Museu de Arte Sacra da Matriz do Pilar de Ouro Preto – [COELHO, 2005. P. 258]

 

SANTA MARIA MADALENA NOS QUATRO EVANGÉLHOS:


 

MATEUS 27:

Após a crucificação, depois da deposição do corpo de Cristo ele foi levado para o Santo Sepulcro,

55 E estavam ali olhando de longe muitas mulheres que tinham seguido Jesus desde a Galileia, servindo-o, 

56 Entre as quais estavam Maria Madalena, e Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu.  [P. 1506]

60 E o pôs no seu sepulcro novo, que havia lavrado numa rocha; e revolvendo uma grande pedra para a porta do  sepulcro, foi-se.

61 E estavam ali Maria Madalena e a outra Maria, assentadas defronte do sepulcro. [P. 1506]

 

MATEUS 28:

Quando foram ver o corpo no Santo Sepulcro, mas Jesus já havia ressuscitado,

1 No fim do sábado, quando já despontava o primeiro dia da semana, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro; [P. 1506] [...]

5 Mas o anjo, falando, disse às mulheres: Vós não tenhais medo; pois eu sei que buscais Jesus, que foi crucificado.

6 Não está aqui, porque já ressuscitou, como tinha dito. [P. 1507]

 

MARCOS 15:

Durante a crucificação,

40 E ali estavam algumas mulheres, olhando de longe, entre as quais estavam também Maria Madalena, e Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José, e Salomé; [P. 

41 As quais também o seguiam, e o serviam, quando estava na Galileia;

e muitas outras, que tinham subido com ele a Jerusalém. [P. 1543]

Depois da crucificação,

47 E Maria Madalena e Maria, mãe de José, olhavam onde o punham. [P. 1544]

 

MARCOS 16:

As mulheres vão ao Sepulcro para ungi-lo, mas ele já havia ressuscitado,

E PASSADO o sábado, Maria Madalena, e Maria, mãe de Tiago, e Salomé compraram aromas para irem ungi-lo. [P. 1544] [...]

6 Porém ele disse-lhes: Não vos assusteis; buscais Jesus Nazareno, que foi crucificado; já ressuscitou, não está aqui; eis aqui o lugar onde o puseram.

9 E Jesus, tendo ressuscitado na manhã do primeiro dia da semana, apareceu primeiramente Maria Madalena,da qual tinha expulsado sete demônios.

10 partindo ela, anunciou-o àqueles que tinham estado com ele, os quais estavam tristes, e chorando.  [P. 1544]

 

LUCAS 24:

Após a ressurreição,

1 No primeiro dia da semana, muito de madrugada, foram elas, e algumas outras com elas, ao sepulcro, levando as especiarias que tinham preparado.

2 E acharam a pedra revolvida do sepulcro.

3 E entrando elas, não acharam o corpo do Senhor Jesus. [...] 

10 E eram Maria Madalena, e Joana, e Maria, mãe de Tiago, e as outras que com elas estavam, que diziam essas coisas aos apóstolos. [P. 1606]

 

JOÃO 19:

Durante a Crucificação,

25 E junto à cruz de Jesus estava sua mãe, e a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Cleofas, e Maria Madalena

26 Ora, Jesus, vendo ali a sua mãe, e o discípulo a quem ele amava estando presente, disse a sua mãe:  Mulher, eis aí o teu filho. [P. 1651]

 

JOÃO 20:

Após a ressurreição, quando Jesus aparece para Maria Madalena e conversa com ela,

1 No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu a pedra já tirada do sepulcro. [P. 1653] [...]

11 E Maria estava chorando fora, junto ao sepulcro. Estando ela, pois, chorando, abaixou-se para interior do sepulcro.

12 E viu dois anjos vestidos de branco, assentados onde jazera o corpo de Jesus, um, à cabeceira e outro, aos pés.

13 E disseram-lhe eles: Mulher, por que choras? Ela lhes disse: Porque levaram o meu Senhor, e não sei onde o puseram. 

14 E tendo dito isso, voltou-se para trás, e viu Jesus em pé, porém não sabia que era Jesus.

15 Disse-lhe Jesus: Mulher, por que choras? Quem buscas? Ela, cuidando que era o hortelão, disse-lhe: Senhor, se tu o levaste, dize-me onde o puseste, e eu o levarei.

16 Disse-lhe Jesus: Maria! Ela, voltando-se, disse-lhe: Raboni! (que quer dizer Mestre).

17 Disse-lhe Jesus:  Não me toques, porque ainda não subi para meu Pai, mas vai para meus irmãos, e dize-lhes: Subo para meu Pai e vosso Pai, e para meu Deus e vosso Deus. [P. 1653]

18 Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos que vira o Senhor, e que ele lhe dissera essas coisas. [P. 1654]

 

Devo ressaltar que, Maria Madalena, frequentemente é associada à mulher adúltera, como por exemplo no filme A Paixão de Cristo, dirigido por Mel Gibson:


36-Cristo e a mulher adúltera – Rodolfo Bernardelli. [BARDI, 1989. P. 45]


JOÃO 8:                           

3 E os escribas e fariseus trouxeram-lhe uma mulher apanhada em adultério;

4 E pondo-a no meio, disseram-lhe: Mestre, esta mulher foi apanhada, no próprio ato, adulterando. [...]

5 E na lei nos mandou Moisés que as tais sejam apedrejadas. Tu, pois, que dizes?

6 Isso diziam eles, tentando-o, para que tivessem de que o acusar. Mas Jesus, inclinando-se, escrevia com o dedo na terra.

7 E como insistissem em perguntar-lhe, endireitou-se e disse-lhes: Aquele que dentre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela. [P. 1627]

 

Também, alguns autores associam Maria Madalena, à Maria, que ungiu o senhor e enxugou seus pés com os cabelos e cuja passagem bíblica aparece duas vezes no Evangelho segundo São João:

 

JOÃO 11:

1 ESTAVA então enfermo um certo Lázaro, de Betânia, aldeia de Maria e de Marta, sua irmã.

2 E Maria era a que ungiu o Senhor com unguento, e lhe enxugou os pés com os seus cabelos; cujo irmão Lázaro estava enfermo. [P. 1634]

 

JOÃO 12:

1 Foi, pois, Jesus seis Dias antes da Páscoa a Betânia, onde estava Lázaro, o que falecera, e a quem ressuscitara dos mortos.

2 Fizeram-lhe, pois, ali uma ceia, e Marta servia, e Lázaro era um dos que estavam à mesa com ele.

3 Então Maria, tomando uma libra de unguento de nardo puro, de muito preço, ungiu os pés de Jesus, e enxugou-lhe os pés com os seus cabelos; e encheu-se a casa do cheiro do unguento. [BÍBLIA SAGRADA, 2015]

 

Para não encerrar totalmente, uma imagem:


37-Crucificação de Jesus - Via Sacra Bom Jesus de Braga -Portugal [https://pt.wikipedia.org/wiki/Via_Sacra_do_Bom_Jesus]


A OBRA DE ANTÔNIO FRANCISCO LISBOA DISPENSA PERFEITAMENTE AS MULETAS DE SEUS MALES. TIVESSE SIDO, O ARTISTA, PRETO, BRANCO, APOLO OU QUASÍMODO, NENHUMA DESSAS POSSIBILIDADES MODIFICARIA A REALIDADE CRIADA POR SEU TALENTO, ACRESCENTANDO-LHE OU DIMINUINDO-LHE MÉRITOS.


Sylvio de Vasconcellos

 

 

REFERÊNCIAS BÁSICAS 

 

ARGAN, Giulio Carlo; FAGIOLO, Maurizio. Guia de história da arte. Lisboa: Editorial Estampa, 1994.

BARBOSA, Waldemar de Almeida. O Aleijadinho de Vila Rica. Belo Horizonte: Itatiaia, 1984.

BARDI, P.M.  Em torno da escultura no Brasil. São Paulo: Banco Sudameris, 1989. P. 45

BAZIN, Germain. A arquitetura religiosa barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record,  [1983]. 2V. (Ed. Francesa 1956 e 1958)

BAZIN, Germain. História da arte. Lisboa: Martins Fontes, 1980. p. 284 (1. ed. 1953)

BAZIN, Germain. Historia de la escultura mundial. Barcelona: Editorial Blume, 1972. P. 331, 419-20.

BAZIN, Germain. Le Baroque – Um Etat de Conscience. In: Barroco. Belo Horizonte: UFOP/Ministério da Cultura, 1990/2.  nº 15, p. 15-18. (II  Congresso do Barroco no Brasil/Arquitetura e Artes Plásticas. Ouro Preto, 25 a 29 de setembro de 1989). [existe tradução In: ÁVILA, Affonso. Barroco – teoria e análise,  p. 17-22]

BAZIN, Germain. O Aleijadinho e a escultura barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record,  1971. (Ed. Francesa 1963)

BÍBLIA SAGRADA. Contendo o Velho e o Novo Testamento.  Salt Lake City, Utah, EUA, 2015. PDF

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JARDIM, Márcio. Aleijadinho; catálogo geral da obra. Belo Horizonte: RTKF, 2006

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ZOLLNER, Frank; POPPER, Thomas. Miguel Ângelo 1475-1564; obra completa. Colônia: Tashen, 2008. 

 

Patos de Minas, 01/05/2022



José Eduardo de Oliveira é licenciado em História pela Universidade Federal de Ouro Preto

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2 Comentários

  1. Dá uma canseira do c..! Mas é história inestigativa. (e como não poderia ser..). Inventariar pistas e indicadores daqueles que fazem com o espírito livre e desinteressado e, daqueles que fazem das representações, perlocuções de suas trapaças.

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  2. Parabens pelo artigo ! Nos mineiros deveriamos ser os primeiros a valorizar o barroco mineiro . Qdo estudante a diretora Filomena Macedo planejava roteiro com excursoes visitando o barroco mineiro e museus do Rio de Janeiro .Atualmente os colegios deveriam incentivar os jovens a cultura . No curso tecnico de musica consta no curriculum a historia da arte . Luana Romao
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