Reclama-ação

 Texto e imagem por Isadora Tavares

Reclamar é algo puramente dos adultos. Essa ideia me assaltou assim, num raiar de dia. Poderia intercalar aqui a noção de que as crianças reclamam, sim — mas não é verdade. Veja, por exemplo, o caso das que não gostam de estudar. Elas não reclamam de estudar; mas sim lamentam ter que ir, afirmando que não querem. Ou seja, as crianças não reclamam, elas apenas expressam seu desejo ou não desejo.

No caso de um adulto que não goste ou não queira ir trabalhar numa escola, pegando o mesmo gancho, surgem um milhão de reclamações:

— Ah, eu detesto acordar cedo;

— Estou com sono;

— Não suporto esse trânsito;

— O ônibus está lotado;

— Ninguém deu bom dia...

E por aí vai. Viram a diferença?

As crianças, diferentemente dos adultos, aceitam seu destino sem reclamar, apenas expõem suas vontades. Não há escolha para os pequenos. É preciso ir para o seu destino, sentar a bunda na cadeira dura, se manter acordado por quatro horas estudando matérias que muitas vezes não gosta, tendo apenas 15 minutos de intervalo. A vida da criança não é fácil, principalmente porque ela não tem outra opção.

Para o adulto, sempre há. Pode optar por lecionar para outra turma, trocar de escola, mudar a rota, propor uma atividade diferente ou, por fim, lutar para conseguir outro emprego, até mesmo em uma área que nada tenha a ver com a escola.

A liberdade de escolha vem junto com a liberdade de reclamação.

Reclamar é um ato legítimo. É um luxo dos adultos. Para os pequenos, resta apenas aceitar sua condição, sem reclamações. Que dureza. Se fosse no mundo das pessoas grandes, choveriam processos. O que é, aliás, um meio “legal” de reclamar.


Isadora Tavares é jornalista e escritora nas horas vagas

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